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Thursday, June 09, 2005

Tereza Cruvinel Uma chance à reforma política

o globo



Instalada hoje a CPI dos Correios — que apesar do nome investigará o que encontrar pela frente — passamos ao segundo momento da crise: terá início a chuva purificadora, estalarão raios e trovões, haverá conseqüências políticas mas depois tudo será mais claro. Estaremos entretanto condenados ao eterno retorno dos escândalos enquanto o sistema político-eleitoral não for reformado.

Depois de ter falado no assunto no discurso de anteontem, o presidente Lula tomou ontem a iniciativa de patrocinar um esforço por sua aprovação, bem como de incentivar o debate e o engajamento da sociedade em favor da reforma. Pela manhã o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, informou que ele receava que a iniciativa fosse confundida com diversionismo para tirar o foco da investigação cabal com que se comprometeu solenemente anteontem. Foi convencido a não se inibir e avançar, o que fez no início da noite ao empossar o Conselho Nacional de Justiça. Talvez a fórmula não seja a melhor: Thomaz Bastos coordenará um grupo composto pelos ministros Aldo Rebelo, Luiz Dulci e Jaques Wagner, que em 45 dias apresentará uma proposta-síntese, a partir dos projetos em tramitação. O essencial já foi aprovado pelo Senado, cujo presidente, Renan Calheiros, já fez algumas tentativas de acordo com os líderes na Câmara para concluir a votação. Embora o PT, o PSDB e o PFL sejam a favor, a votação esbarra em partidos como o PP, o PL e o PTB. Os mesmos que Jefferson deixou no sal.

Anteontem, ao falar da urgência da reforma política, Lula completou: "É evidente que ela não poderá ser obra de uma só vontade, mas o resultado de uma conjunção de vontades republicanas." Parecia propor um grande acordo político, inclusive com a oposição, que tendo realmente adotado na crise uma atitude responsável e madura, certamente daria também uma chance à reforma. O que precisa ser buscado é este acordo.

Fernando Henrique já lamentou não ter brigado mais por ela quando era possível. Lula também já perdeu sua hora de ouro, ao sair tão forte das urnas. Ambos aplicaram o capital inicial em outras reformas. Mas há uma outra situação que pode favorecê-la, a de um Congresso enfraquecido precisando recuperar-se. Aqui se disse, desde o início, que a CPI dos Correios danaria com o governo, mas muito mais com o Congresso. Se metade do que Jefferson disse for provado, os partidos que resistem poderão se curvar.

Lula externou também ontem a compreensão de que é preciso convencer a sociedade de que há relação entre o sistema político, a corrupção e o fisiologismo: "Conclamo a todos, universidades, sindicatos, movimentos sociais e entidades em geral a debater a questão da reforma política". Tal compreensão está surgindo. Chegaram ontem ao blog desta coluna no Globo On Line muitas mensagem propondo "reforma política já". Mas algumas dizendo que culpar o sistema é mera desculpa.

É preciso dizer por que os presidentes fazem coalizões. Num Congresso com 18 partidos representados, o presidente eleito jamais terá a maioria. Ao eleger os deputados, os eleitores compõem uma Câmara fragmentada. FH foi eleito em primeiro turno, mas o PSDB conquistou apenas 20% das cadeiras. O PT, com Lula, apenas 17%. Para fazer a maioria e governar é preciso fazer alianças. Com a legislação partidária liberal que temos, criar partido é facílimo. E alguns são criados para propiciar a seus donos o acesso ao fundo partidário e ao tempo de televisão. Tornam-se mercadores de apoio político. É preciso enxugar este quadro. Uma vez eleitos, em campanhas individuais, os parlamentares viram donos do mandato e de seus votos, que são trocados por cargos, verbas, favores. Agora, teria surgido até a mesada. Contra isso, precisamos pelo menos testar os sistema de listas partidárias fechadas. O eleitor votará na chapa do partido. Contados os votos e calculado o número de cadeiras obtidas, serão distribuídas pela lista, de cima para baixo. No Congresso, os que não seguirem a orientação partidária correrão o risco de ser excluídos da lista na próxima eleição. O governo poderá negociar com partidos, e não com indivíduos e grupos. Partidos aliados, como em outros países, participarão do governo, poderão indicar ministros e ocupantes de altos cargos. Mas nunca até o quinto escalão, como vem acontecendo. Nunca as diretorias que manipulam dinheiro público, objeto de tanta cobiça.

O financiamento público de campanhas e a restrição à mudança de partido completam as quatro medidas que tornariam o sistema mais funcional e a governabilidade mais segura.

MUITOS estão pressionando Lula para que faça logo a reforma ministerial ou anuncie medidas econômicas em maturação. Ele resistiu. Será panacéia, não resolverá nada. Mas o Congresso, enquanto toca a CPI, terá que trabalhar. É o que o povo espera, disse ele. Neste sentido, ele mesmo sugeriu uma reunião entre o ministro Palocci e o presidente do Senado, Renan Calheiros. Ambos andaram sugerindo uma agenda legislativa. Como ambos queriam ver o jogo Brasil-Argentina, fizeram isso juntos, na casa de Renan, para depois tratarem da proposta de agenda.

DIRCEU estará de volta hoje. Teme-se que dê seus costumeiros tiros na oposição, numa hora em que o governo não tem bala na agulha para comprar briga.

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