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Friday, June 10, 2005

LUÍS NASSIF:A disputa siderúrgica

folha de s paulo
 Está mal contada essa disputa entre a Companhia Vale do Rio Doce e a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional). E mal contado está o voto da SDE (Secretaria de Desenvolvimento Econômico) do Ministério da Justiça. Analisam-se, lá, dois atos de concentração da Vale: a aquisição de quatro minas de minério de ferro e seus direitos sobre a Casa de Pedra (mina da CSN sobre a qual ela tem direito de preferência na aquisição de minério) e da ferrovia MRS.
O SDE escreveu um parecer de 186 páginas, avaliando o risco de a Vale passar a usar seu poder de monopólio para impor preços abusivos ao mercado interno.
A alegação da Vale é que os preços internos correspondem aos preços internacionais menos as despesas de exportação. Entendendo assim, a Seae julgou suficiente explicitar a obrigatoriedade da Vale de manter essa prática.
O voto da SDE é confuso. Alega que "nada impede" que no futuro a Vale cometa abusos. Como "nada impede"? A SDE supõe que a Vale possa desobedecer impunemente às recomendações dos órgãos de defesa da concorrência e que nem a lei nem a "golden-share" do governo irão conseguir enquadrá-la? Corta essa!
É importante analisar a posição das duas companhias no contexto real dessa disputa, que positivamente não é o mercado interno.
A Vale tem absoluto predomínio sobre a rota do Atlântico, o que lhe dá enorme poder estratégico. Se a CSN conseguir a liberação do minério e se associar a um competidor global, cessa esse poder absoluto e a CSN ganha um formidável valor estratégico.
Para Marcos Lutz, diretor-executivo de Infra-Estrutura e Energia da CSN, a Vale tem usado mal desse poder. Sua decisão de aumentar os preços em 70% recentemente teria sido imprudente, pois poderá viabilizar novos competidores do Brasil no mercado internacional. Sua preocupação demonstra claramente qual é foco da disputa.
Há claramente duas estratégias de agregação de valor em ambas as empresas: a Vale, procurando atrair grupos internacionais para entrarem no país associados a ela; a CSN, procurando ganhar valor estratégico como mineradora.
O grande enigma é o próximo lance de ambas. Pouco tempo atrás, a CSN tentou uma operação igual à da AmBev: seu controlador a venderia a um concorrente inglês e se tornaria parte do bloco de controle do comprador. No ano passado, o BNDES adquiriu participação na Vale sob o argumento de que corria-se o risco de seu controle ser vendido para a Nippon Steel.
A disputa dos dois gigantes é o primeiro movimento de rearranjo da siderurgia brasileira, dentro do novo foco de desnacionalização e de alinhamento com as grandes estratégias globais.
Se é bom ou ruim é outra discussão. Mas não se pode mascarar esse jogo sob esse pretexto de defesa da competição. Ainda mais sabendo-se do enorme ônus que a cadeia produtiva da siderurgia (minério e aço) impôs a seus consumidores no último ano, tirando parte expressiva da competitividade dos manufaturados.

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