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Friday, June 17, 2005

Celso Ming - Distorções




O Estado de S. Paulo
17/6/2005

 A MP do Bem anteontem divulgada isentou de Imposto de Renda sobre ganhos de capital a venda de imóveis, desde que o dinheiro apurado na venda seja usado, em 180 dias, na compra de imóvel residencial.

É o governo federal reconhecendo que o regime dado aos ganhos de capital é um entrave ao investimento. Mas enormes deformações que pesam sobre a economia não foram desfeitas.

Neste ano, o governo corrigiu a Tabela do Imposto de Renda bem menos do que deveria (apenas 10%), mas, afinal, admitiu que foi preciso corrigi-la para não cobrar imposto sobre inflação. No entanto, há anos recusa-se a aplicar o mesmo procedimento sobre os ganhos de capital. Esta é uma distorção que gera outras distorções.

Os preços dos imóveis e das ações são tão sujeitos à inflação quanto os salários. Em 1994, o governo acabou com a correção monetária desses ativos sob a argumentação de que o Plano Real acabara com a inflação. Mas, de 1994 até hoje, a inflação acumulada é de 143,52% e, no entanto, a Receita Federal não permite que esses valores sejam atualizados pela inflação.

Quem, por exemplo,comprou um imóvel no início de 1994 por R$ 100 mil e está vendendo agora por R$ 400 mil teve um ganho de capital (lucro imobiliário) de R$ 300 mil. Antes de 1994, o governo admitia que era preciso atualizar esse valor. Isso implicava reajustar o preço de compra do imóvel pela inflação do período. No exemplo acima, o preço ajustado de compra do imóvel seria de R$ 243.520 (e não de R$ 100 mil).

Esse conceito é importante porque vai determinar o ganho de capital sobre o qual incide o Imposto de Renda de 15%. Caso fosse atualizado como teria de ser, o Imposto de Renda seria de R$ 8.472. Mas, como essa correção não é admitida pela Receita Federal, o imposto passa a ser de R$ 45 mil (15% de R$ 300 mil).

Como esse lucro é fictício, na medida em que não passa de inchaço provocado pela inflação, a falta de correção do valor de compra do imóvel define um confisco ou um imposto indevido sobre patrimônio. Esta não é apenas choradeira de proprietário rico. A falta de correção do preço de compra do imóvel para efeito de apuração do ganho de capital provoca aberrações.

Em primeiro lugar, empurra os negociadores de imóveis para vendas "por fora". Ou seja, a venda do imóvel acaba sendo registrada abaixo do preço real. Isso, por sua vez, exige também uma renda "por fora" por parte do comprador e estimula as receitas informais.

Em segundo lugar, deforma as demonstrações financeiras das empresas que vivem da compra e venda de imóveis (imobiliárias). Como não podem atualizar o preço de compra ou o custo da construção, acabam tendo lucros irreais e sobre eles são obrigadas a recolher Imposto de Renda também descabido.

Em terceiro lugar, desincentiva a troca de imóveis. O advogado Ricardo Lacaz Martins, sócio do escritório Lacaz Martins, Halembeck, Pereira Neto, Gurevich e Schoueri Advogados, lembra que a Receita Federal implantou um programa entre 1968 e 1988 que reduzia em 5% por ano o imposto sobre a venda em caso de lucro. "Esse programa era inteligente porque, ao fim de 20 anos, por exemplo, quando o imóvel estivesse bem antigo, o imposto seria zerado. Ou seja, o incentivo à troca era grande." Isso não existe hoje.

Em quarto lugar, contribui para a diminuição da oferta de emprego na área da construção civil, que é uma grande contratante de mão-de-obra de baixa qualificação. Se não existe procura por novos imóveis, não existem novas construções e, portanto, novos empregos.

Essas distorções não foram corrigidas pela MP do Bem.

ming@estado.com.br

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