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Friday, April 29, 2005

LUÍS NASSIF:Noves fora, zero

 O sábio recluso, com quem converso de vez em quando, não conseguiu entender a lógica das mudanças no Ministério da Fazenda -com a saída do secretário de Política Econômica, Marcos Lisboa, sua substituição pelo secretário-executivo, Bernard Appy, e a substituição de Appy por Murilo Portugal, que foi secretário do Tesouro e estava trabalhando no FMI (Fundo Monetário Internacional).
Assim como eu, ele não acredita em fogo amigo derrubando Lisboa. Além de pessoa afável e competente no que se dispunha a fazer -cuidar das reformas microeconômicas-, Lisboa não chegava a ser tão ortodoxo quanto se tornou o próprio Appy.
A leitura do sábio é que uma das características de regimes em queda é o reforço das barricadas com a tropa considerada mais fiel. Por regime em queda, entenda-se a linha ulta-ortodoxa adotada pelas equipes da Fazenda e do Banco Central. A política econômica está cada vez mais contestada, desde por banqueiros de peso, como Fernão Bracher, até comentaristas que acreditavam no mito da infalibilidade dos papas do Banco Central.
É essa uma das mais estranhas linhas da política palocciana, diz ele. No "board" do Fed (Federal Reserve) americano, há sete governadores e sete tendências diferentes de visão da economia. Lá eles acham fundamental a diversidade de ângulos para que se cometam menos erros.
Na linha regressiva, que vem desde a gestão Pedro Malan, no governo Fernando Henrique Cardoso, o que se observa é a redução da qualidade da equipe a cada mudança. As duas ou três receitas prontas são sempre as mesmas, sem mudança sequer da aparência do prato. Na definição do meu interlocutor, Portugal é o legitimo mais do mesmo multiplicado por tudo igual. Tem o agravante -lembra-me uma economista- de não ter o menor jogo de cintura. Não tinha no Tesouro, onde o trabalho político era mais ameno. Agora, terá que administrar demandas políticas também.
O sábio sugeria que, nem que fosse apenas por curiosidade, poderiam encomendar"papers" independentes de nomes ortodoxos, como José Alexandre Scheinkman -cujo currículo sozinho vale mais do que toda a equipe econômica-, de Paulo Rabello de Castro e de outros ortodoxos de elevado nível acadêmico. Faz questão de enfatizar apenas os ortodoxos, para que sua sugestão não seja desqualificada como "desenvolvimentista".
Ele diz que essa é uma prática corriqueira nos Estados Unidos e na Europa, em que não se despreza o saber acumulado fora das estruturas burocráticas. Pelo menos haveria um arejamento do debate, algo que na condução da política econômica das grandes economias é considerado essencial.
Quando o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, fala e repete continuamente que "em todo lugar é assim", seria bom ele lembrar que os conselhos dos bancos centrais do G7 têm, todos eles, economistas de múltiplas tendências porque nenhum pais quer correr o risco de embarcar em uma viagem transatlântica com um só piloto, uma só bússola e um só mapa.
Não há espaço para brilho, criatividade ou dinamismo em jogo.

FOLHA DE S.PAULO

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