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Wednesday, December 28, 2005

A IMAGEM DE LULA: DANUZA NÃO FALA SOZINHA

A IMAGEM DE LULA: DANUZA NÃO FALA SOZINHA
27.12, 17h55
por Paulo G. M. de Moura, cientista político

A observação atenta - compulsiva até - da dinâmica da conjuntura política, treina o analista para os detalhes e os indicadores que, muitas vezes, passam desapercebidos do olhar leigo. A experiência, a teoria, o conhecimento de pesquisas e técnicas de estudo do comportamento político e o acompanhamento diário e obsessivo dos acontecimentos políticos e econômicos através da leitura de diversas fontes de informação, desenvolve no analista uma sensibilidade que explica, muitas vezes, a capacidade de antecipar fatos e tendências.

Nesse contexto, é comum perceber, inclusive, que insights que integram minha relação de temas para futuros artigos – que terminam adiados ou não publicados pelo atropelo dos acontecimentos – apareçam nos textos de outros analistas que, na mesma situação profissional, terminam vendo o que os leigos não conseguem ver, ou somente perceberão quando a dimensão oculta dos fatos já veio à percepção das maiorias.

Algumas das ferramentas de trabalho mais preciosas de um cientista político são as pesquisas de opinião, qualitativas e quantitativas. Cada uma a seu modo, as duas técnicas, operando combinadas, são instrumentos poderosos para a análise do comportamento político e para a orientação estratégica para a ação. Na impossibilidade de dispor desse tipo de instrumento aferindo tudo o que se gostaria de aferir sobre a percepção da política pela opinião pública, resta-nos recorrer à sensibilidade adquirida pela prática, para observar com atenção os sinais que a realidade emite, e que podem ser considerados indicadores, e não apenas fatos isolados ou dimensões irrelevantes da cena política.

A percepção da imagem de Lula que Danuza Leão expressa na sua entrevista à IstoÉ Dinheiro é um desses casos. Quero dizer, ao afirmar que "a nítida impressão de que esse foi o ano em que as pessoas se cansaram do presidente Lula. Ninguém o agüenta mais, não dá mais para ouvir a voz dele ou ver a figura dele na televisão. Cansou. Enjoou. Para mim, 2005 é o ano em que essa exaustão fica marcada", Danuza Leão está expressando um sentimento que não é só seu, mas de uma parcela expressiva da opinião pública brasileira.

Essa constatação, que faço sem ter a oportunidade de avaliar pesquisas qualitativas de percepção da imagem de Lula pela população, nasce, em primeiro lugar, de um sentimento compartilhado. Apesar de orientar minha observação da dinâmica da política pela ótica de Maquiavel (na leitura hermenêutica e epistemológica de sua obra e não na percepção vulgar que se tem desse pensador como pretenso defensor da maldade na política), não menosprezo o poder da intuição e dos sentimentos difusos como instrumento de alimentação da análise política.

Quando esse sentimento é apenas meu, tomo o cuidado de armazená-lo nalguma gaveta do cérebro, a espera de que a dinâmica da política forneça outros indicadores capazes de me permitir avaliar se aquela percepção primeira é apenas minha, ou se ela expressa sentimentos e percepções de mais gente, a ponto de permitir retirá-la da gaveta e transformá-la em artigo publicável.

É o caso presente. Apesar da frieza e objetividade com que devo orientar minha análise, confesso a você leitor, que, de uns tempos para cá comecei a sentir asco - perdão Lula - mas é esse mesmo o nome do sentimento; asco, ao ver e ouvir o presidente da República em seus pronunciamentos e entrevistas à mídia. Mesmo tendo a obrigação profissional de vê-lo e ouvi-lo toda vez que fala, não raras vezes não resisto ao impulso de desligar o rádio ou a TV, deixando para ler o conteúdo da fala em algum site depois, só para não ter de ver a cara ou ouvir a voz de Lula. É um erro, pois a imagem e som também fornecem informações qualitativas relevantes ao analista. Mesmo assim, não resisto ao zapping para outro canal.

Não obstante, guardei meu sentimento naquela gaveta do cérebro a que me referi algumas linhas atrás. Mas, comecei a ouvir cada vez mais pessoas, em diferentes círculos sociais, expressando o mesmo sentimento; a mesma percepção. No entanto, como circulo em ambientes em que predomina a antipatia pelo petismo, resolvi manter minha percepção na gaveta, apesar de, nos últimos tempos, ela ter começado a transbordar de tantas observações similares que fui acumulando.

Ao analisar o "personagem difícil", Lula, preferi - como no artigo publicado em 20/12/2005, "A candidatura Lula tem salvação?",- apoiar-me em informações sobre pesquisas publicadas e não publicadas que circulam pelas páginas da imprensa e nos sites e blogs de política, para falar da impressão que tenho sobre a irreversibilidade dos danos causados por Luis Inácio Lula da Silva à imagem de Lula.

A entrevista de Danuza Leão foi o indicador que me faltava para tirar o insight da gaveta. Como escreveu a companheira Eliane Cantanhêde na Folha de São Paulo, referindo-se ao camarada Zé Dirceu, Danuza não fala sozinha. Ao contrário, reflete uma tendência. Não tenho dúvidas, agora, que se a imagem de Lula for submetida ao teste de uma bateria de pesquisas qualitativas com grupos focais, esse mesmo sentimento aparecerá como expressão de uma parcela significativa da opinião pública. Não sei que percentual da população sente o mesmo, mas o perfil sócio-econômico e cultural de Danuza, assim como dos círculos sociais em que ouvi a mesma leitura da imagem do presidente, é um indicador relevante.

Mais importante do que apenas o percentual dos que percebem Lula assim, é a qualidade do sentimento revelado: enjôo, asco, saturação, cansaço. Esse é o conteúdo qualitativo dos 46% de rejeição a Lula, que a última pesquisa CNT/Sensus apontou. Esse tipo de sentimento é de muito difícil, senão impossível, reversão. É isso que chamei de "carcinoma na face de Lula" no artigo a que me referi antes.

Não sei não, posso estar errado, mas acho que Lula está politicamente morto como candidato a cargos majoritários. Sua liderança foi desmistificada. Sua ascendência política está restrita a uma parte, apenas, do petismo robotizado. E só.

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