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Sunday, March 26, 2006

CCPL - Comando de Caça ao Primeira Leitura

 CCPL - Comando de Caça ao Primeira Leitura
Por Reinaldo Azevedo e Rui Nogueira

A bola foi cantada neste espaço, na edição anterior, num texto intitulado "Operação Caça-Alckmin" (Clique para ler ). Era fatal que, definida a candidatura do PSDB, o governador passasse a ser a bola da vez. Tudo se dá em tempo perfeito para uma narrativa verossímil e para alimentar as lendas de cada um. Na mesma edição em que a Folha faz um editorial de primeira página acusando os arreganhos autoritários do governo Lula, vem a manchete: "Nossa Caixa beneficia aliados de Alckmin".

Não pode haver, como se vê, veículo mais isento do que este. À esquerda, apanha Lula; à direita, Alckmin. O lead do texto da primeira página é o seguinte: "O governo de Geraldo Alckmin, candidato do PSDB à Presidência, direcionou recursos de publicidade da Nossa Caixa para favorecer políticos aliados na Assembléia Legislativa". Mais adiante: "Entre os favorecidos então ainda a Rede Vida e a revista Primeira Leitura, criada por Luiz Carlos Mendonça de Barros, ministro no governo FHC". O texto na página A-16 começa assim: " O governo Geraldo Alckmin (PSDB) direcionou recursos da Nossa Caixa para favorecer jornais, revistas e programas de rádio e televisão mantidos ou indicados por deputados da base aliada na Assembléia Legislativa".

Não é só isso. No terceiro parágrafo do mesmo texto, informa o jornalista Frederico Vasconcelos: "[a cúpula palaciana] autorizou a veiculação de anúncios mensais na revista Primeira Leitura, publicação criada por Luiz Carlos Mendonça de Barros, ministro das Comunicações no governo Fernando Henrique Cardoso. Ele é cotado para assessorar Alckmin na área econômica. Recentemente, a Quest Investimentos, empresa de Mendonça de Barros, foi escolhida para gerir um fundo da Nossa Caixa ". Em seguida, Vasconcelos afirma que o "banho de ética" prometido por Alckmin "recebe uma ducha de água fria".

E pronto. O enredo já parece suficiente para justificar os objetivos e chegar ao corolário, que remete à tese central do PT: são todos iguais. À esquerda e à direita. Lá e cá.

Lamenta-se aqui que a verdade não tenha parecido forte o bastante a Vasconcelos, e ele tenha criado uma teia verossimilhante de ilações para conferir mais peso à reportagem. Primeira Leitura, de fato, foi criada por Luiz Carlos Mendonça de Barros. Mas não pertence mais ao ex-ministro desde setembro de 2004. Como informa o próprio jornal, "de outubro de 2004 até julho de 2005 (...), Primeira Leitura circulou com anúncios de página dupla da Full Jazz". Ou seja: Mendonça de Barros já não tinha mais qualquer vínculo com a revista, de que deixou de ser, infelizmente, até mesmo colunista.

É estranho que tal informação não esteja no jornal. Não a ignora Frederico Vasconcelos. Não a ignoram as pessoas que respondem por aquilo que sai publicado no jornal. A omissão torna o cardápio mais saboroso: o leitor tem a impressão de que o ex-ministro, "cotado" para assessorar Alckmin, está sendo beneficiado não apenas neste negócio, como também em outro, do qual não se dá detalhe porque a parte picante do prato do dia tem de ficar com o mistério, tem de estar na ilação, na sugestão da irregularidade.

Antiga campanha publicitária da Folha demonstrava que se podia mentir falando apenas a verdade. É verdade que Mendonça criou Primeira Leitura; é verdade que ele foi um dos interlocutores de Alckmin para assuntos econômicos; é verdade que outra empresa a que é ligado mantém relações comerciais – e legais! – com a Nossa Caixa. O conjunto, embalado como está, induz a uma mentira.

Os fatos
A reportagem omite que os anúncios da Nossa Caixa foram veiculados tanto no site como na revista Primeira Leitura. Faziam parte de um pacote, e era este o acordo que tínhamos firmado coma agência de publicidade, que era com quem Primeira Leitura tratava do assunto. O veículo impresso tem uma tiragem auditada de 25 mil exemplares, com distribuição nacional. Está longe de ser uma publicação clandestina. E quem a conhece, goste ou não de sua linha editorial, não se atreve a dizer que seja malfeita ou busque atender ao interesse deste ou daquele deputado estadual. Aliás, eis um defeito nosso: não conhecemos um só parlamentar da Assembléia Legislativa de São Paulo.

O site Primeira Leitura está, certamente, entre os mais visitados no Brasil. A Brasil Telecom, onde está hospedado, dispõe de sistema fechado de verificação de audiência. Em julho de 2005, mês da última veiculação de anúncio da Nossa Caixa, Primeira Leitura teve 348.608 visitas, com 1.437.567 page views. No mês seguinte, o site alcançava 496.712 visitas e 1.897.003 page views. Tais números fazem dele um dos sites de política e economia mais visitados do país — se é que não está disputando o primeiro lugar. Site e revista não precisam recorrer a relações escusas, fora do âmbito profissional e técnico, para conquistar os anúncios que tem.

No texto da primeira página, afirma a Folha, referindo-se inclusive a nós: "Os demais acusados também negam irregularidades". Pergunta-se ao jornal: do que somos "acusados" exatamente?

Aliados de quem?
Se a reportagem não provasse que a publicidade da estatal serviu ao propósito de beneficiar os aliados de Geraldo Alckmin, então ela estaria, digamos, meio furada para os propósitos a que se destina e não mereceria o destaque que mereceu, ombreando, na balança da isenção, com o editorial que acusa os desvios de conduta democrática do governo Lula.

Aliás, lendo o editorial editorial, não há como ignorar que tudo aquilo já foi dito aqui. Desde janeiro de 2002. Pois bem, assim, é preciso que as omissões sustentem o que se quer provar: omite-se que Mendonça de Barros não é mais dono da revista; omite-se que os anúncios do banco eram veiculados mensalmente na revista e todos os dias no site. E se omite, queremos crer, o mais importante.

Se estivéssemos mesmo fazendo site e revista a soldo de Geraldo Alckmin, seríamos, ademais, notórios traidores, vira-casacas. Que saibamos, Primeira Leitura foi o único veículo de comunicação que anunciou seu apoio à pré-candidatura de José Serra à Presidência da República. Foram escritos nada menos de 40 textos a respeito. Mais do que isso: o debate chegou a azedar em muitos momentos com partidários da candidatura do governador. E atenção: nunca, em nenhum momento, o secretário Roger Ferreira ou qualquer outro emissário dos Bandeirantes resolveu lembrar que a Nossa Caixa tinha sido anunciante da revista, cobrando as "obrigações" correspondentes.

A área comercial de Primeira Leitura interfere na redação da revista tanto quanto, ou menos, a da Folha interfere no jornal. Não fazemos, por exemplo, suplementos voltados para segmentos do mercado com pauta dirigida. Não há nada de ilegal nisso. Mas não fazemos.

Nada disso interessou à reportagem. O leitor pouco atento ao detalhe há de concluir que Primeira Leitura está ligado a algum deputado estadual (lead da chamada de capa e da reportagem principal), pertence a Luiz Carlos Mendonça de Barros (que estaria sendo irregularmente beneficiado) e, claro, apoiou o pleito do governador, que queria ser candidato à Presidência da República. Por isso levou os aúncios da Nossa Caixa.

Não vamos mudar
Uma matéria como esta da Folha é coisa boa para Primeira Leitura? No que diz respeito a nosso público leitor, é indiferente. Os que cotidianamente nos acusam de força-auxiliar dos tucanos continuarão a fazê-lo, agora munidos de supostas "provas". Os que aprenderam a resistir à maledicência têm motivos novos para atravessar mais esta maré. É claro que, no que respeita ao mercado publicitário, bom não é.

O leitor precisa saber: nestas horas, um ou outro anunciantes podem ficar temerosos: "Não é aquela revista do Alckmin? E se o Lula ganhar?" O Departamento Comercial de Primeira Leitura já tinha pronta uma nova proposta para ser enviada à Nossa Caixa. É o que fazem todas as publicações do mundo: procuram anunciantes. Melhor rasgar. Afinal, uma revista de "política, economia e pensamento", com 25 mil exemplares, tida até por seus inimigos como das mais bem escritas do país, e um site diário, com uma média mensal de 1,5 milhão de page views, só podem contar com o anúncio de um banco estadual se estiverem metidos em alguma safadeza.

Com ou sem revista, com ou sem site diário, no formato que tem hoje ou em outro qualquer, Primeira Leitura não vai morrer. Não vai deixar de dizer o que diz. Há cinco anos estamos por aí, combatendo aquele mesmo espírito totalitário identificado no editorial da própria Folha neste domingo. Por todas as razões que lá estão expostas e também porque entendíamos que o país precisa de um outro rumo — político, econômico e até institucional —, consideramos que José Serra era a melhor opções para a Presidência da República.

Outro foi o caminho escolhido pelo PSDB. O governador Geraldo Alckmin não precisa pagar as nossas contas para que digamos, agora, com a mais absoluta clareza: que vença a disputa pela Presidência da República! Os eventos recentes envolvendo Francenildo Costa não deixam espaço para reticências ou hesitações.

Parece que os documentos que chegaram à Folha têm origem numa sindicância interna da Nossa Caixa e também passam pelo Ministério Público Estadual. É evidente que se misturaram alhos com bugalhos, e fomos incluídos num rol de patrocinados que supostamente têm vínculos com deputados estaduais. Quem selecionou e-mails que citavam Primeira Leitura sabia muito bem o que estava fazendo: não é a primeira agressão. Não será a última.

No site do PT, procurem lá, uma moça que se identifica como jornalista nos acusa de agentes da black propaganda da CIA. Nada menos de três pessoas identificadas com o partido processam a revista, numa tentativa de asfixiá-la economicamente. Processos que fariam Kafka corar de constrangimento.

Como já se disse aqui, se fosse o caso de escrever por 30 dinheiros, todo mundo sabe que o outro lado pagaria muito mais. Os nossos internautas e leitores fiquem tranqüilos. Não desistiremos. Se preciso, a gente escreve "na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapé". A agressão à Primeira Leitura pertence à mesma  lógica que tentou transformar Francenildo num bandido; que, em minutos, fez de uma testemunha um investigado

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