Enfim, chegou a CPI da Privataria
A criação da CPI da Privataria é a primeira boa notícia de 2006.
Parece coisa do passado, mas é uma oportunidade para se pensar no futuro. Num ano eleitoral, permitirá a observação do comportamento do tucanato diante do exame da roupa suja que deixou para trás. Se não for abafada, investigará as privatizações ocorridas entre 1990 e 2002. Nesse período, três governos venderam 100 empresas da Viúva e arrecadaram US$ 105,5 bilhões de dólares. Nove em dez transações se deram durante o tucanato. Prometeram abater a dívida pública, mas ela foi de 30% do PIB em 1995 para 62% em 2002.
Prometiam atrair recursos externos, mas os arrematadores foram socorridos por US$ 15,6 bilhões de empréstimos do BNDES e outro ervanário saído dos fundos de pensão de empresas estatais. Em pelo menos dois setores (elétrico e ferroviário) o velho e bom BNDES teve que correr atrás de caloteiros. Prometiam crescimento econômico e nos oito anos do surto privatista dos tucanos a economia cresceu abaixo de 3%, na mediocridade preservada pelo Nosso Guia.
Grampos telefônicos, editais self-service, consórcios incestuosos e contratos de gaveta deram componentes escandalosos ao processo. O apagão de 2001 e tarifas telefônicas lunares impostas por concessionários retrógrados foram as duas principais seqüelas dessa festa.
Nem tudo foi desgraça. Sabendo-se que em 1995 os teletecas da Embratel estatal tentaram monopolizar o acesso à Internet e produziram uma fila de 15 mil pessoas, vê-se que alguma faxina precisava ser feita.
Felizmente, o tucanão Sérgio Motta desinfetou a teleburocracia. A recuperação das rodovias entregues ao empresariado e o bom desempenho da Vale do Rio Doce mostram que a privatização das empresas estatais não foi maligna em si. Podia dar certo e, em certos casos, deu.
O exame da privataria pode ter um alcance superior à simples curiosidade fofoqueira em cima dos grandes patrimônios amealhados no período. (Fofoca: é provável que as privatizações tenham produzido as mais rápidas fortunas da história nacional. Nunca tanta gente ganhou tanto dinheiro em tão pouco tempo, sem produzir um só prego.)
Importa saber por que privatizações como a da Light e da Eletropaulo deram errado ou por que o acesso à telefonia deu certo, mas uma ligação de celular custa mais caro no Brasil do que nos Estados Unidos. Os "altos companheiros" poderiam avançar um pouco e explicar por que o BNDES (na versão petista) resgatou ferrovias quebradas onde a Funcef e a Previ (na versão pré-petista) haviam posto o dinheiro de seus aposentados.
A privataria foi uma política ruinosa de um governo acometido de compulsão vendedora para agradar a banca. Ocorreram erros de gestão que podem ser mais bem conhecidos e estudados. Se o problema for analisado apenas pelo lado da corrupção, não se vai longe. Ensinar as pessoas honestas a não fazer besteira é tão importante quanto tentar impedir que os ladrões furtem.
Do contrário, quem quiser saber o que houve no Brasil dos tucanos terá que pesquisar nas bibliotecas das universidades americanas. Na do Massachusetts Institute of Technology, por exemplo, pode-se ler o trabalho do economista indiano Sunil Tankha. Chama-se: "Uma confusão de meios e fins: A breve e infeliz época da privatização da energia elétrica no Brasil."
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